A escritora polaca Olga Tokarczuk, Prémio Nobel da Literatura em 2018, disse dia 8 de Outubro, à noite, que “o leitor é sempre mais inteligente do que o escritor”, durante uma conversa com o jornalista Carlos Vaz Marques, sobre “Limites”, que decorreu na Tenda Vila Literária do FOLIO – Festival Internacional de Música de Óbidos.
Olga Tokarczuk justificou a afirmação com o facto de o leitor ser um “recetor sensível” ao que está a ser contado. “Muitas vezes, devolvem-me mais do que escrevo. Como leram outros livros são capazes de compará-los”, explicou. “É um coautor com quem estou constantemente em diálogo.”
Questionada por uma pessoa da assistência se equacionava escrever sobre o FOLIO e a sessão em que estava a participar, a escritora polaca disse que a escolha dos temas sobre os quais escreve não é consciente. “Vêm ter comigo e são impertinentes, porque querem ser contados. Vêm ter comigo durante a noite e inspiram-me. Não sou dona do meu próprio fado”, observou.
Convidada a explicar o que sentiu quando soube que era a primeira mulher a receber o Prémio Nobel da Literatura, Olga Tokarczuk respondeu que “o lugar do qual sai a minha escrita nem é feminino, nem masculino”. “O tal narrador terno não tem sexo. Sou mulher, estou solidária com as mulheres e agrada-me quando a voz feminina é ouvida, mas a arte e a literatura são coisas mais profundas, que não se conseguem dividir em géneros.”
A designação de “narrador terno” motivou uma pergunta de Carlos Vaz Marques sobre como chegou a essa ideia de ser capaz de escapar ao espaço e ao tempo e que vê espaços e tempos que não abarcamos totalmente. “Não sou capaz de começar a escrever sem ouvir a voz do narrador. Sei o que acontece, mas não sei quem vai contar essa história”, afirmou a escritora. “A autoficção é uma ferramenta narrativa muito potente. Vê o mundo como um todo. De cima, vê-se como somos todos iguais uns aos outros.”
Psicóloga de formação, Olga Tokarczuk referiu que “a literatura não é uma invenção” e que nos acompanha desde o início da formação humana. “E os mitos formatam a nossa sensibilidade e a forma de vermos o mundo”, acrescentou. “Já sei que não vou inventar nada novo, apenas acrescentar novos elementos deste mundo ao mundo antigo.”
A propósito da invasão da Ucrânia pela Rússia, a escritora polaca disse que, muitas vezes, se sente incapaz de comentar, porque a informação é transmitida para não ser compreendida, ao ser “semeada e controlada”. “Desde o início, todos sentimos insegurança e medo, porque as guerras de hoje não têm limites. Toca a todos”, avisou. “Somos manipulados por tiranos, como Putin”, acusou.